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sexta-feira, 16 de setembro de 2011

A TIRANIA DO “MAIS” - Presb. Dr. José Mauro Jordão

Lembro quando criança dos meus dois primos, sentados à mesa, medindo com os olhos a caneca de café com leite do outro para ver se tinha mais quantidade do que na sua. E se tivesse era uma choradeira pirracenta que durava enquanto não houvesse igualdade de volume, como se pela régua do olhar se definisse sua igualdade de importância com o irmão.

E assim pela vida afora crescemos rejeitando o “menos” que nos liberta e sempre buscando obsessivamente o “mais” que nos escraviza no tempo e no espaço. Sê queremos ser o que outro é, e sê desejamos ter o que o outro tem somos escravos da cobiça que nos despersonaliza e frustra. Os outros podem nos servir de modelo, porém temos de escavar mais em nós mesmos para descobrir os dons e as potencialidades que nos guiam num caminho muito pessoal de satisfatórias realizações. Nós não somos iguais aos nossos semelhantes.

 Comenta-se, talvez sem estar contido na biografia, que Assis Chateaubriand, ou “Chatô”, quando ainda adolescente, no corredor das salas de aula do colégio, batia a cabeça na parede, e dizia: “Hei de ser rico! Hei de ser rico!” O seu “mais” desesperado o fez construir um império jornalístico, mas o lado “menos” do seu organismo não resistiu e resultou numa trombose cerebral, em 1960, deixando-o, pela seqüela, paralisado e sem fala por longos e amargos anos, até sua morte em 1968. Foi velado ao lado de dois famosos quadros: o Cardeal de Velázquez e um Nu de Renoir; representando neles o seu gosto humanista das três coisas que mais amou na vida: poder, arte e mulher. O ideal realizado de riqueza do dono dos Diários Associados não se manteve no “mais” e foi se perdendo no “menos” do ocaso da vida.

A maior riqueza entesourada em nossa mente é a sabedoria de viver, e essa ninguém nos rouba, porque dela temos o prazer de compartilhar, de coração, com aqueles que vivem conosco. Caetano Veloso fez apologia do “menos”, em favor da liberdade, em sua música “Alegria, Alegria”: “Sem lenço, sem documento/ Nada no bolso ou nas mãos/ Eu quero seguir vivendo, amor/ Eu vou... Por que não, por que não?..” .

Quanto mais temos, em bens, mais tempo dedicamos a eles, com medo de perdê-los, e menos tempo para o prazer em família.  Em Mateus 6 Jesus nos aconselha no “menos”: “Não acumuleis para vós outros tesouros sobre a terra, onde a traça e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam; porque onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração; mas ajuntai para vós outros tesouros no céu.” Destes vale a pena ter mais!