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segunda-feira, 5 de julho de 2010

PERDEMOS A COPA DO MUNDO. E DAÍ?

(Considerações - e até certo desabafo - de um brasileiro que ama o futebol, mas ama mais o Brasil)

O Brasil foi eliminado pela Holanda na Copa do Mundo de Futebol lá na África do Sul, belo país pelo que temos visto nas imagens e um povo bastante alegre, às vezes, alegres demais com aquelas vuvuzelas que certamente afetariam meu labirinto. Mas e daí?

Já estamos há 08 anos sem vencer uma copa do mundo. E daí? Isso também não importa porque já ficamos 24 anos sem sermos campeões. Até que em 1994 vencemos às duras penas lá nos USA nos pênaltis a nossa adversária, Itália. Depois fizemos a fatídica final contra a França em 1998, e a vitoriosa final na Ásia contra a Alemanha em 2002. Voltamos a cair em 2006 frente a mesma França que tem sido um carrasco do Brasil em Copas do Mundo e agora foi a vez da Holanda que já havia nos desclassificado em 1974 na Copa da Alemanha. Voltamos mais cedo para casa. Perdemos da Holanda. E daí?

Eu sou muito passional e fico muito agitado em partidas de futebol. Por isso resolvi lavar meu carro na hora do jogo. Simplesmente levei o carro para o quintal atrás da minha casa, me preparei e, durante os 90 minutos da partida fiquei ali lavando meu carro. Soube dos gols pelas manifestações. No final do jogo, com a derrota já sacramentada, me saí um morador de um prédio vizinho, na sacada de seu apartamento e grita a plenos pulmões. “Vamos trabalhar cambada. Vamos voltar pro trabalho”. Ri para valer, e muitos fizeram o mesmo pelo que pude ouvir. É isso mesmo. O Brasil perdeu, foi desclassificado, mas e daí? O mundo não acabou, oras bolas. O Brasil perdeu, mas e daí?

Não tenho me dado ao “luxo” de ouvir os comentaristas de futebol a respeito dessa desclassificação. Parece que o disco quebrou. É sempre o mesma lengalenga. Uns culpam o Dunga, outros alegam que havia jogadores que não tinham qualificações para estar no grupo. Os mais duros, como o Milton Neves, desandaram a falar do Felipe Melo. E assim por diante. Afinal de contas é comum numa hora como essa, procurarmos os culpados. Isso é natural, mas é preciso que haja equilíbrio. Não podemos evitar a avaliação porque ela, sendo feita com sobriedade e serenidade, pode nos ajudar a evitar cometermos os mesmos erros, mas é preciso que haja coerência e ponderação, o que me parece não é próprio de grande parte da mídia do futebol.

Há comentaristas e locutores que são mais torcedores do que qualquer outra coisa. O Galvão Bueno, por exemplo, com todo o respeito e admiração que lhe tenho, torce mais do que narra uma partida. E isso vai moldar, de certa maneira, o pensamento do brasileiro nesse campo esportivo. O Brasil foi desclassificado, mas e daí?

Futebol não tem lógica e cá entre nós se a lógica valesse, a Holanda tinha mesmo que vencer porque olhando do ponto de vista tático, ela é uma seleção mais bem assentada táticamente. Tem melhor equilíbrio em todos os seus setores. E devemos lembrar que em 1982 éramos mesmo muito melhores que a criticada Itália e perdemos por três gols a dois. Aquela lá doeu. Futebol não tem lógica. E o Brasil voltou para casa eliminado, mas e daí?

Futebol é só esporte e esporte é saúde e cultura. Talvez tenha doído mais para alguns do que para outros porque esse esporte que deveria ser entendido como cultura, saúde, evento para o congraçamento dos povos, virou uma grande oportunidade de se fazer muito dinheiro. A FIFA é uma das instituições mais ricas do mundo, mas e daí? No que é que isso consiste? Que benefícios isso tem trazido para aquelas nações onde há enormes bolsões de pobreza? Que benefícios isso tem trazido para aquelas nações onde não há educação de boa qualidade, a saúde está doente, a segurança está refém do crime organizado e a violência tem assumido uma multiformidade gigantesca? Isso lembra a você algum país em particular? Creio que sim e por isso eu repito a questão: O Brasil perdeu a Copa do Mundo, mas e daí?

Devo admitir que o bem humorado grito do meu vizinho tem tudo a ver: “Vamos trabalhar cambada. Vamos voltar pro trabalho”. Isso mesmo, vamos trabalhar! Vamos voltar para o nosso mundo onde temos que optar entre Marina, Dilma e José Serra.

Voltemos para o país que já se tornou um cassino a céu aberto, onde a hipocrisia é latente em todos os níveis, onde a religiosidade nos faz ter que encarar num sábado uma Marcha Para Jesus que é mais uma vitrine para o lustro do ego de alguns apóstolos do que Marcha para Cristo mesmo, e em outro sábado temos que engolir a Parada Gay num ato de afronta sem precedentes.

Voltemos para nosso país onde o aposentado é tratado como escória, coisa obsoleta, com exceção dos políticos aposentados.

Voltemos para o país onde a justiça é morosa e bastante condescendente.

Voltemos para o Brasil onde um jogador de futebol, sem nível de intelectualidade desenvolvido e que pouca contribuição traz à cultura do país, vale mais do que o professor, o médico e outros profissionais que se matam para sobreviver, o que é um paradoxo.

Vamos voltar para a realidade porque a Holanda, por exemplo, que nos desclassificou, nunca foi campeã mundial de futebol, e é um país com problemas geográficos e topográficos enormes se comparados ao Brasil, continua sendo um país rico de um povo extremamente educado. Vamos voltar para o trabalho porque perder para a Holanda não foi uma desonra.

Eu pergunto: perdemos a Copa do Mundo, mas e daí? Eu não vou chorar por isso porque afinal de contas o Felipe Melo e o Dunga que estão sendo crucificados, em meu entendimento errônea e cruelmente, vão voltar para suas vidas e terão que conviver com essa experiência que os marcou muito mais do que marcou a você e a mim. Mas eles estão muito bem do ponto de vista social e econômico se comparado à maioria dos brasileiros.

Por outro lado, muitos dos que se angustiaram e até choraram diante de um aparelho 14’ dentro do seu humilde casebre, tiveram que pegar o seu busum e voltar para o trampo porque afinal de contas é essa gente que movimenta esse país e é essa gente que, mesmo no anonimato, faz a grandeza do Brasil.

Vamos voltar para o trabalho cambada, sou assim para mim:

Vamos cair na real, pessoal. Vamos descer dessa aeronave chamada ilusão e pisar no chão da realidade.